Senhor, falta cumprir-se Portugal.
Ó Portugal, hoje és nevoeiro...
Deus quis que a terra fosse toda uma,
Que o mar unisse, já não separasse.
Sagrou-te, e foste desvendando a espuma,
E a orla branca foi de ilha em continente,
Clareou, correndo, até ao fim do mundo,
E viu-se a terra inteira, de repente,
Surgir, redonda, do azul profundo.
Quem te sagrou criou-te português,
Do mar e nós em ti nos deu sinal.
Cumpriu-se o Mar, e o Império se desfez.
Senhor, falta cumprir-se Portugal.
F. Pessoa
Portugal, um país mais resignado, envelhecido...
É o retrato de um país com um número avassalador de idosos – mais de
dois milhões –, muitos dos quais a viver sozinhos e a sobreviver com uma
pensão inferior ao salário mínimo nacional. Um país onde o rendimento
médio das famílias (a preços constantes) baixou para 27.811 euros no ano
passado, quase menos mil euros do que em 2011, e onde o número de
pensionistas com reformas inferiores ao salário mínimo nacional está
perto dos 1,5 milhões.
São
"números que contam a nossa história mais recente" os que aparecem
compilados no último "Retrato de Portugal", o terceiro do género traçado
pela base de dados Pordata, da Fundação Francisco Manuel dos Santos, e
que acaba de ser divulgado.
Nevoeiro
Nem
rei nem lei, nem paz nem guerra,
define
com perfil e ser
este
fulgor baço da terra
que
é Portugal a entristecer –
brilho
sem luz e sem arder,
como
o que o fogo-fátuo encerra.
Ninguém
sabe que coisa quere.
Ninguém
conhece que alma tem,
nem
o que é mal nem o que é bem.
(Que
ância distante perto chora?)
Tudo
é incerto e derradeiro.
Tudo
é disperso, nada é inteiro.
Ó Portugal,
hoje és nevoeiro...
É
a Hora!
F. Pessoa
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