No centenário do nascimento de Fernando Namora ( 1919-1989)
Fernando Gonçalves Namora (
Condeixa-a-Nova, 15 de abril de 1919 - Lisboa, 31 de janeiro de 1989) foi
um médico e escritor português, autor duma extensa obra, das mais
divulgadas e traduzidas nos anos 70 e 80.
Licenciado em Medicina pela
Universidade de Coimbra, pertenceu à geração de 40, grupo literário que
reuniu personalidades marcantes como Carlos de Oliveira, Mário Dionísio,
Joaquim Namorado ou João José Cochofel.
O seu volume de estreia foi Relevos (1937), livro de
poesia. Mas já publicara em conjunto com Carlos de Oliveira e Artur Varela, um pequeno livro de
contos Cabeças de Barro. Em
1938 surge o seu primeiro romance As
Sete Partidas do Mundo que viria a ser galardoado com o Prémio Almeida Garrett no mesmo ano em que
recebe o Prémio Mestre António Augusto Gonçalves, de artes plásticas -
na categoria de pintura. Ainda estudante e com outros companheiros de geração
funda a revista Altitude e envolve-se activamente no projecto
do Novo Cancioneiro ( 1941), colecção poética de 10
volumes que se inicia com o seu livro-poema Terra.
Com uma obra literária que se
desenvolve ao longo de cinco décadas é de salientar a sua precoce vocação
artística, de feição naturalista e poética, tal como a importância do período
de formação em Coimbra, mais as suas tertúlias e movimentos estudantis. Os
muitos textos que escreveu, nos diferentes momentos ou fases da vida literária,
apresentam retratos com aspectos de picaresco, observações naturalistas e
algum existencialismo. Independentemente do enquadramento, Namora foi um
escritor dotado de uma profunda capacidade de análise
psicológica, inseparável de uma grande sensibilidade e linguagem poética. Escreveu, para
além de obras de poesia e romances, contos, memórias e impressões de
viagem.
Entre os muitos títulos que publica em prosa contam-se Fogo na noite escura ( 1943) , Casa da Malta ( 1945), As minas de S. Francisco ( 1946), Retalhos da Vida de um Médico (1949 e 1963), A Noite e a Madrugada ( 1950) O Trigo e o Joio ( 1954), O Homem disfarçado ( 1957) Domingo à Tarde ( 1961, Prémio José Lins do Rego), Os Clandestinos ( 1972), Resposta a Matilde ( 1980) e O Rio Triste ( 1982, Prémio Fernando Chinaglia, Prémio Fialho de Almeida e Prémio D. Dinis) e ainda as biografias romanceadas de Deuses e Demónios da Medicina (1952) Publicou em poesia Mar de Sargaços ( 1940), Marketing ( 1969) e Nome para uma Casa ( 1984). Foram romances como os Retalhos da Vida de um Médico, O Trigo e o Joio, Domingo à Tarde, O Homem Disfarçado ou O Rio Triste, que vieram a ser traduzidos em diversas línguas, tendo inclusive, em 1981, sido proposto para o Prémio Nobel da Literatura, pela Academia das Ciências de Lisboa e pelo PEN Clube.
Se quisermos contextualizar, sistematizar a sua obra
em fases distintas de criação literária, podemos identificar: (1) o ciclo de juventude,
principalmente enquanto estudante em Coimbra, coincidente com o
livro-poema Terra e o romance Fogo na Noite Escura;
(2) o ciclo rural, entre 1943 e 1950, representado pelas
novelas Casa da Malta (escrita em 8 dias) e Minas de
San Francisco, ou pelos romances A Noite e a Madrugada, O
Trigo e o Joio sem esquecer os Retalhos da Vida de um Médico, (3) o ciclo urbano, coincidente com a sua vinda para
Lisboa, marcado pela solidão e vivências do quotidiano, e que se terá
reflectido no romance O Homem Disfarçado, em Cidade
Solitária ou no Domingo à Tarde; (4) o ciclo cosmopolita, ou seja, dos cadernos de um
escritor, balizado no final dos anos 60 e década de 70, explicado pelas
muitas viagens que fez, nomeadamente à Escandinávia, e pela sua participação
nos encontros de Genebra; 5) o ciclo
final, entre a ficção contemporânea, onde se insere o
romance O Rio Triste ou Resposta a Matilde,
intitulado pelo próprio divertimento, e as reflexões íntimas
de Jornal sem Data( 1988).
Sendo talvez uma das suas obras mais
conhecidas, Retalhos da Vida de um Médico, foi a primeira a ser
adaptada ao cinema, por intermédio do realizador Jorge Brum do Canto (em 1962,
filme seleccionado para o Festival de Berlim), seguindo-se a série televisiva, da
responsabilidade de Artur Ramos e Jaime Silva (1979-1980).
O Trigo e o Joio foi adaptado para o
cinema em 1965, por Manuel Guimarães, com Manuel da Fonseca. Do mesmo
realizador, para televisão e em 1969, tem-se Fernando Namora. Domingo
à Tarde (seleccionado para o Festival de Veneza), foi realizado
por António de Macedo em 1965. Em 1975, surge Fernando Namora – Vida e Obra realizado por Sérgio Ferreira. Também
em 1975 Namora colaborou na publicação periódica Jornal do Caso
República (1975). A Noite e a Madrugada, de 1985 deve a sua realização a Artur Ramos.
Resposta a Matilde, de 1986 foi adaptado a televisão por Dinis Machado e Artur Ramos. Em 1990 regista-se O Rapaz do Tambor, curta
metragem de Vítor Silva.
Casa-Museu de Fernando Namora
Ali, a dois passos da
Vila, o Rio de Mouros. Nasceu de um fio de água, do suor de uma rocha,
entre urzes e montes. Ainda a meio da serra, é um ribeirito que não dá para
matar a sede a um rebanho. Mas depois, a terra começa, subitamente, a ficar
brava, com penedos que têm o ar de montanhas, e o rio despenha-se entre os
silvais e as fragas em som e espuma, com um fragor que, de Inverno, com as
cheias, estremece os ouvidos da serra e dos homens. – texto de
1941.
É possível visitar a
casa onde Fernando Namora nasceu, e onde os seus pais abriram um pequeno
estabelecimento comercial, situada no centro da vila de Condeixa-a-Nova, distrito de Coimbra.
Inaugurada em 30 de
Junho de 1990, esta iniciativa resultou da ideia de um grupo de amigos, seus
conterrâneos, que quiseram homenageá-lo através da proposta da criação de uma
Casa-Museu, de modo a recordar a todos, e nas palavras do Sr. Ramiro de
Oliveira, que é Condeixense e que aqui viveu a sua infância e parte da
mocidade.
Aberta ao público
desde então, nela se pode encontrar o seu escritório, tal qual estava em
Lisboa, com todos os seus livros e objectos pessoais, e que acabou por ser o
destino do que fui acumulando ao longo dos anos, coisas minhas, coisas
do que vi e vivi e ainda valiosas coisas alheias que de algum modo se
relacionam comigo. - carta de 7 de junho de 1984.
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